Neurotoxicose em bovinos associada ao consumo de “cevada” (bagaço de malte) contaminada por Aspergillus clavatus no Estado do Rio de Janeiro

Abstract

Descrevem-se quatro surtos de uma doença neurológica que afetou bovinos de aptidão leiteira que consumiam “cevada” (bagaço de malte) contaminada por Aspergillus clavatus nos municípios de Valença, Paty do Alferes e Barra Mansa, no Estado do Rio de Janeiro. Em todas as propriedades, a cevada estocada apresentou visível contaminação fúngica e somente os animais que ingeriram o subproduto adoeceram. A morbidade variou entre 41,42% e 73,08%, a mortalidade entre 33,33% e 69,23% e a letalidade entre 51,11% e 94,73%. Os animais evidenciaram tremores musculares, hiperestesia, ataxia, paresia e paralisia progressivas e marcada perda de peso. Os mais afetados caminhavam com apoio sobre os boletos flexionados e alguns assumiam a posição de "cão sentado". Quando os animais eram forçados a movimentarem-se, as quedas eram frequentes. Houve acentuada queda na produção leiteira, embora o apetite e a dipsia tenham se mantido normais até próximo à morte ou à eutanásia. A evolução clínica variou de 1 a 16 dias. Dos animais que se recuperaram, quatro permaneceram com sequelas locomotoras leves. As alterações macroscópicas incluíram áreas pálidas focais na musculatura cardíaca, músculos semitendíneo, semimembranáceo, adutor, pectíneo e Longissimus dorsi. O quadro histopatológico caracterizou-se por alterações degenerativo-necróticas, tumefação, vacuolização e cromatólise nos neurônios dos núcleos dos pedúnculos cerebelares, da base do cérebro, da medula oblonga e do “H” medular. Histologicamente, as lesões musculares caracterizaram-se por degeneração e necrose coagulativa, com mineralização, por vezes, incipiente. Em um bovino havia, adicionalmente, necrose coagulativa no miocárdio e nefrose mioglobinúrica. O cultivo micológico das amostras de cevada resultou no isolamento e identificação do fungo A. clavatus. O quadro clínico patológico foi reproduzido experimentalmente em ovinos que consumiram 40g/kg de cevada por dia, coletada de duas das propriedades investigadas; esses animais desenvolveram sinais clínicos e lesões microscópicas, em grande parte, similares às observadas nos bovinos. Conclui-se que embora os resíduos da indústria cervejeira tenham razoável relação custo-benefício na alimentação de bovinos, é necessário que se observem alguns cuidados para evitar eventuais intoxicações e consequentes prejuízos econômicos.