Filhos da reforma agrária: terra, casa e lógicas de sucessão em Novo Horizonte

Abstract

Muitos são os estudos que tratam sobre herança e sucessão para as famílias camponesas na literatura antropológica brasileira (WOORTMAN, 1995; MOURA, 1975, CARNEIRO 1998), mas estes não foram estendidos à realidade dos assentamentos de Reforma Agrária. O objetivo principal deste estudo é verificar como os bens da família assentada são geridos com enfoque nas lógicas de sucessão das terras de Reforma Agrária. O estudo de caso foi realizado no assentamento Novo Horizonte, localizado em Campos dos Goytacazes -RJ, cujas terras foram desapropriadas em 1984. Este assentamento é considerado um dos únicos emancipados pelo INCRA no estado do Rio de Janeiro, o que implica em duas conseqüências diretas: não obtém mais investimentos ligados à política pública da Reforma Agrária e, além disso, passaram a valer as regras legais relacionadas à herança e sucessão que estão presentes no Código Civil, não mais a legislação agrária federal. Foram realizadas entrevistas com os titulares da terra e com os jovens filhos dos assentados, perfazendo um total de dezessete redes familiares de forma a analisar suas representações a respeito da terra, além de verificar como acontece a negociação no âmbito familiar acerca dos processos de sucessão e herança. Uma das considerações centrais deste estudo é que o sistema casa-lote é considerado o ponto de apoio para a família assentada. Esse sistema diz respeito à utilização tanto da terra da família assentada quanto da casa na antiga região central da usina, que hoje também é de posse da família, de forma a combinar os usos residenciais e produtivos da terra para abarcar diferentes membros familiares em diversos estágios da vida, de acordo com suas necessidades e com o gerenciamento destas realizado pelo titular ou mesmo pelo sucessor. O termo sucessor é utilizado por esse trabalho para aludir tanto aquele filho que assume a titularidade do lote, bem como aquele que é responsável pela organização do centro de decisão moral da família na segunda geração. Se a terra não for fragmentada de forma excessiva pode manter o seu espaço produtivo, mas se a estratégia familiar levar à fragmentação será utilizada eminentemente como espaço de residência. Neste sentido, a propriedade rural: o lote de Reforma Agrária é considerado, muitas vezes, o único bem da família, ainda por vezes insuficiente para a reprodução social de todos os filhos dos titulares da terra, é preservado por ser primordialmente um ponto de apoio para os arranjos e estratégias empreendidos pela família assentada.