A produção e o consumo de milho entre agricultores familiares do semiárido sergipano e o cuscuz nosso de cada dia

Abstract

Nos últimos anos, a produção do milho em Sergipe tem passado por grandes transformações e o Estado hoje se destaca tanto pela expansão da área cultivada como pelo aumento da produtividade. Essas recentes mudanças impulsionaram a publicação de uma série de trabalhos de pesquisa relacionados à temática do milho nesta unidade da federação, no entanto, seu foco tem sido sempre associado ao aumento da produtividade e às possíveis implicações ambientais derivadas da expansão desta monocultura. Para além das questões econômicas e ambientais implicadas nesse processo, é preciso reconhecer que as transformações ocorridas no perfil técnico e social da produção de milho no Estado envolvem dimensões políticas, culturais, sociais e institucionais oportunas de serem abordadas, sendo fundamental reconhecer o papel do milho como um alimento que está presente no dia a dia da agricultura familiar. Partindo desse entendimento, nosso objetivo com essa pesquisa foi analisar as transformações ocorridas ao longo das últimas décadas nas relações de coprodução estabelecidas pelos agricultores de base familiar do semiárido sergipano com o milho e suas repercussões, tanto no que diz respeito ao papel desempenhado por esse cultivo na organização de seus sistemas produtivos, como no que se refere às práticas alimentares, buscando identificar os fatores que confluíram para uma reconfiguração destas relações em um ambiente marcado pela expansão das monoculturas. Considerando que o espaço agrário não é homogêneo, existindo uma diversidade de trajetórias de transformação da agricultura no semiárido sergipano, relatamos duas experiências relacionadas à produção de milho crioulo que podem ser chamadas de contra-movimentos, pois se diferenciam da lógica dominante de produção, construindo e articulando novas estratégias. No que diz respeito ao lugar do milho na alimentação humana, procuramos dar uma atenção especial ao cuscuz, tendo em vista que, ao abordarmos aspectos materiais e simbólicos associados a esse alimento, podemos ampliar o entendimento sobre os possíveis efeitos da vinculação do milho aos circuitos globais de commodities no que diz respeito às práticas alimentares. A pesquisa envolveu um esforço de revisão de literatura e análise de dados quantitativos e qualitativos referentes à expansão das monoculturas de milho em Sergipe, bem como entrevistas com atores-chave. Foram realizadas, também, entrevistas semiestruturadas com famílias agricultoras nos municípios de Carira e Simão Dias.