Doença do armazenamento lisossomal causada pela ingestão espontânea de Sida carpinifolia em cervos Sambar (Cervus unicolor) cativos no Rio de Janeiro.

Abstract

Casos de doenças induzidas por plantas tóxicas em herbívoros domésticos são bastante relatados por todo o mundo e vêm sendo estudados também no Brasil. Pouco se sabe, contudo, sobre os aspectos epidemiológicos e patológicos dessas condições em animais selvagens de vida livre ou criados em cativeiro. Os riscos de desenvolvimento dessas toxicoses em cativeiros vêm aumentando, conforme os habitats naturais são destruídos pela ação humana, e mais centros de conservação de vida silvestre e zoológicos são criados. Nesse estudo são descritos os aspectos epidemiológicos, biológicos e clinicopatológicos, lectinohistoquímicos e ultraestruturais de um surto de doença do armazenamento lisossomal de oligossacarídeos induzido pela ingestão de Sida carpinifolia em cervos Sambar jovens (Cervus unicolor) no zoológico da Fundação Rio-Zoo no Estado do Rio de Janeiro. Nove cervos apresentaram sinais clínicos neurológicos caracterizados por déficits proprioceptivo e motor. Os sinais neurológicos incluíram principalmente depressão, incoordenação, dismetria, ataxia, membros em base ampla, tremores musculares, perda do tônus lingual, quedas frequentes e morte. Macroscopicamente foram observados hematomas, secundários a traumas provocados por machos dominantes do rebanho, e estriações esbranquiçadas, principalmente no córtex renal. As lesões histológicas incluíam acentuada tumefação/vacuolização citoplasmática especialmente em neurônios, pâncreas exócrino, células foliculares da tireoides e do epitélio renal, necrose neuronal com evolução para lise e esferoides axonais. Pelo exame lectino-histoquímico os vacúolos eram formados por acúmulo de oligossacarídeos marcado especialmente pelas lectinas S-WGA, WGA e Con-A. Ultraestruturalmente, a tumefação/vacuolização citoplasmática correspondeu à intensa distensão de lisossomos, formação de corpos residuais densos ou granulares, fragmentos de membranas e corpos mielinoides. O estudo demonstrou a suscetibilidade de Cervus unicolor à swainsonina contida na S. carpinifolia. Possivelmente, a intoxicação nos animais deste estudo ocorreu pela restrição alimentar sofrida pelos animais mais jovens, decorrente da hierarquia entre machos no grupo. Pôde-se determinar ainda a marcada similaridade do quadro clínico e patológico entre os cervos descritos nesse trabalho e outros herbívoros domésticos.