Política que alimenta: o Programa de Aquisição de Alimentos e as transformações no Assentamento Campo Alegre – Nova Iguaçu (RJ)

Abstract

O Brasil tem sua formação historicamente vinculada à agricultura, mas a valorização da agricultura familiar enquanto segmento estratégico para o desenvolvimento rural só ganhou destaque a partir das últimas décadas do século XX. Esse reconhecimento esteve diretamente relacionado ao fortalecimento dos movimentos sociais no processo de redemocratização do país, que possibilitou a formulação de políticas públicas específicas voltadas para o campo. Nesse cenário, destacam-se a atuação da Comissão Pastoral da Terra – CPT e do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra – MST, considerados referências na luta pela terra e pelos direitos dos trabalhadores rurais. Entre as principais conquistas desse período, está a criação do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar – PRONAF, em 1995, e, posteriormente, do Programa de Aquisição de Alimentos – PAA, em 2003. Este último é reconhecido como uma política pública inovadora por articular a promoção da produção da agricultura familiar ao acesso à alimentação adequada para populações em situação de vulnerabilidade social. Após duas décadas de existência, o PAA foi relançado em 2023, incorporando reformulações e gerando novas expectativas quanto ao seu alcance e efetividade. No estado do Rio de Janeiro, a agricultura apresenta peculiaridades importantes, visto que historicamente houve uma priorização do crescimento urbano, resultando na marginalização das áreas rurais. O Assentamento Campo Alegre, localizado no município de Nova Iguaçu, exemplifica essa realidade. Criado na década de 1980, em plena região metropolitana, o assentamento enfrenta desafios relacionados à disputa por terra, à infraestrutura e à falta de regularização fundiária. A presente pesquisa teve como objetivo principal investigar a aplicação do PAA no Assentamento Campo Alegre, por meio da realização de entrevistas com agricultores locais e organismos públicos. Buscou-se compreender se o programa está sendo efetivamente implementado no território, de que forma os grupos sociais estão inseridos, e qual o papel dos órgãos públicos nesse processo. Como objetivos complementares, a pesquisa analisou a possibilidade de ampliação da política pública, bem como a dinâmica dos sujeitos envolvidos e os entraves institucionais existentes. Os resultados indicam que diferentes dimensões – sociais, políticas e territoriais – atravessam a implementação de políticas públicas em contextos marcados por desigualdades históricas. Constatou-se que o fortalecimento da presença do Estado, por meio de programas como o PAA, pode gerar impactos positivos e contribuir para a melhoria das condições de vida em territórios como o de Campo Alegre, desde que acompanhado por estratégias que considerem as especificidades locais e promovam maior articulação entre os atores envolvidos.